domingo, 8 de julho de 2012

Hospital de São Gonçalo é alvo de investigações após mortes de dez bebês

Praça Zé Garoto sem número. Um endereço onde o sonho da maternidade morre diariamente. No Hospital da Mulher Gonçalense, a dor do parto se enfrenta na solidão, principalmente se ela vier durante a madrugada — “médico também é gente, descansa”, como disse uma enfermeira. A camisola preparada para o grande dia desfila por um banheiro sujo de sangue, com descargas quebradas. A mãe que reclama das fezes no vaso sanitário recebe a ordem: pegue o balde e jogue água. Não interessa se os pontos da cesariana doem na barriga. Aliás, muitas outras coisas não têm importância ali. A primeira da lista é a higiene. É nesse prédio, com letreiro bonito em que se vê uma foto delicada de uma gestante, que morreram dez bebês de junho até agora. As histórias são tristes e, se não provam erro médico, esbanjam negligência, destrato, total descuido. E, por isso, são alvo de investigações. Na maternidade, mesmo depois da lavagem por que passou no dia 30 de junho, dois dias antes da visita do Cremerj, só foi possível esconder as macas que ficavam nos corredores, mas não a falta de boas práticas e de controle de infecção. A urina que vazou do coletor da paciente não precisa ser limpa. Afinal, “já secou”, garante uma profissional de enfermagem. Um acompanhante se assusta e repreende a funcionária. Ela, talvez lembrando-se de que ali tudo deveria parecer limpo, manda, então, que passem pano no chão. — Vi gente entrar com comida na UTI e manipular dinheiro. Meus filhos devem ter pegado a bactéria na UTI — conta o vigilante Leandro Borges, de 29 anos, que assistiu à morte de seus meninos, os gêmeos Raone e Ryan, nos dias 22 e 27. Relatos de falta de álcool a 70% e gaze para trocar curativo são frequentes. — Enfermeiras mandam a família comprar — conta Roberta dos Santos, de 22 anos, que perdeu sua menina Manuela após passar a madrugada do dia 27, desacordada, sem assistência médica. A Prefeitura de São Gonçalo afirma que a maternidade está aberta, mas não informa quantos bebês estão internados com infecção. Em nota, diz que as crianças recebem o atendimento necessário. Vidas perdidas Jorge Miguel Mirela Freitas, de 24 anos, teve seu terceiro filho, Jorge Miguel (foto), no dia 21 de abril. O bebê nasceu no sétimo mês de gestação, com 2kg e 43cm. No dia 9 de junho, foi internado no Hospital Infantil, porque estava encatarrado. Seria bronqueolite. Na enfermaria, teria pegado coqueluche, que evoluiu para pneumonia. A criança morreu na UTI do Hospital da Mulher, no dia 21. “Meu bebê ficou esverdeado, as mãos, pretas. Senti que ele partiria naquela noite. Passei a madrugada na porta”. Raone e Ryan Elizângela Pantoja, de 36 anos, estava a 12 dias de completar sete meses de gestação quando teve um sangramento e muitas dores, no dia 1 de junho. No dia 2, os gêmeos Raone e Ryan nasceram com 1,34kg e 39cm. Estavam na UTI para ganhar peso. “A notícia da infecção veio quando o Raone morreu, no dia 22”, diz a mãe. Ryan morreu cinco dias depois. Médicos dizem que eles estavam com uma bactéria contraída na gestação. A mãe estaria com infecção urinária. Elizângela alega que não fez exame nem recebeu antibióticos. “Como eles poderiam saber se eu tinha infecção?!”. Kauã Dulcinéia Silva da Conceição, de 21 anos, estava com sete meses de gestação quando deu entrada no Hospital da Mulher, no dia 21 de junho, às 5h, com hemorragia. Fez ultrassom e teriam lhe dito que a criança estava bem. No dia 22, às 14h, o bebê não mexia mais, estava morto. Miguel Islana Maria Oliveira, de 23 anos, estava com 39 semanas quando Miguel nasceu, no dia 20. Ela ficou na sala de pré-parto, onde as “paredes estavam sujas de fezes e a grade da cama, de sangue”. A mãe conta que o bebê não pegava o peito e não havia evacuado. Apesar disso, recebeu alta no dia 22. No mesmo dia, ela voltou para o pronto-socorro, porque Miguel estava pálido e desidratado. Lá, ele vomitou fezes. O bebê morreu no dia 24, por obstrução intestinal, no Hospital da Mulher Gonçalense. Manuela Roberta dos Santos, de 22 anos, estava no nono mês de gestação quando sentiu muitas dores e chegou desacordada ao Hospital da Mulher, na madrugada do dia 27. Foi atendida apenas pela manhã. Manuela nasceu morta, com 2,5kg. Iago Michelle Barcelos, de 25 anos, estava no oitavo mês de gestação e foi internada na madrugada do dia 26, perdendo sangue. Iago nasceu às 2h, com 1,92kg e 45cm. O pediatra disse que ele estava bem, mas iria para a incubadora ganhar peso. “Às 2h do dia 27, vieram me chamar para ver meu filho. Ele iria para a UTI. Não quis pegá-lo, porque tinha ido ao banheiro e não havia sabão para lavar as mãos. Às 5h, ele morreu. Se soubesse que era uma despedida, teria pegado ele no colo pelo menos uma vez”, diz a mãe, que contesta a informação de que teria passado uma bactéria para o filho na gestação. Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/rio/hospital-de-sao-goncalo-alvo-de-investigacoes-apos-mortes-de-dez-bebes-5422374.html#ixzz203nIKeFS

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