sábado, 17 de março de 2012

Falta remédio para leucemia

SAÚDE

Falta remédio para leucemia

Desde fevereiro, distribuição de medicamento está irregular e pacientes recorrem ao MPPE e à Justiça para garantir o tratamento

Publicado em 16/03/2012, às 07h33

Do JC Online

Washington Ataide não recebe o remedio há 15 dias. Cada caixa custa R$ 12 mil / Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem

Washington Ataide não recebe o remedio há 15 dias. Cada caixa custa R$ 12 mil

Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem

A interrupção do tratamento de câncer tem levado ao desespero pacientes da Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco (Hemope). Portadores de leucemia mieloide crônica denunciam que desde fevereiro está irregular a distribuição de mesilato de imatinibe, de nome comercial Glivec, medicamento utilizado em substituição ao transplante de medula, de uso contínuo e que aumenta o tempo de vida do usuário. Cansados e temendo o agravamento da leucemia, os doentes estão recorrendo ao Ministério Público Estadual (MPPE) e à Justiça. Também preparam um manifesto para hoje, na porta do hospital.

"Antes de morrer tenho que agir, brigar pelos meus direitos", diz o técnico em eletrônica Washington Ataíde de Moura, 44 anos, que desde o dia 1º de março está sem medicamento e busca, diariamente, esclarecimento sem sucesso no Hemope. Pálido e debilitado, Washington não se conforma com a falta de atenção. "Sinto dores nas pernas e fraqueza. Sou paciente do Hemope há três anos, procuramos informação e ninguém explica exatamente porque o remédio está faltando. Quando vamos à farmácia do hospital, ninguém também sabe dizer quando ele estará disponível", conta.

Washington levou o caso à imprensa e protocolou denúncia no Ministério Público Estadual. No dia seguinte foi buscar ajuda no Conselho Estadual de Saúde, que deve fiscalizar o SUS, onde foi orientado, no entanto, a procurar a Associação de Usuários (Aduseps), para mover ação na Justiça e conseguir resultado mais rápido. A Promotoria da Saúde do MPPE informa que encaminhará ofício ao Hemope cobrando esclarecimentos. Médicos do hospital afirmam que a interrupção do tratamento é prejudicial. "Pode causar uma leucemia aguda e tornar a doença resistente até mesmo ao transplante de medula", explica um deles.

Cada caixa de Glivec, afirmam, custa R$ 12 mil, o que impossibilita a compra individual. Esta é a segunda vez em três semanas que os doentes reclamam da falta do medicamento.

O diretor presidente do Hemope, Divaldo Sampaio, minimizou a denúncia e disse desconhecer que doentes em tratamento há mais de um ano estejam sem tomar o remédio. "É um problema dessa semana, da última segunda-feira", afirmou, ignorando inclusive a denúncia anterior, de fevereiro.

Afirmou que a atual falta de Glivec se deve ao envio de um quantitativo incompleto (não informou a quantidade exata), pelo Ministério da Saúde. "Temos 200 pacientes cadastrados, e mensalmente essa demanda cresce 30% ou menos", alegou. De quem seria a culpa? O diretor do Hemope não sabe dizer. "Mudou o processo da Apac (Autorização de Procedimentos Ambulatoriais de Alto Custo)", respondeu, sem mais uma vez identificar se o erro era do Hemope ou do Ministério da Saúde.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Lista de assinaturas do abaixo-assinado Opção do paciente do sigilo ou não do prontuário médico

Lista de assinaturas do abaixo-assinado Opção do paciente do sigilo ou não do prontuário médico

quinta-feira, 15 de março de 2012

Alunos de Enfermagem da UFMT acionam o MP contra os de Medicina







    09/03/2012 - 08:00

    Alunos de Enfermagem da UFMT acionam o MP contra os de Medicina

    Da Redação - Lucas Bólico
    Foto: Lucas Bólico - ODKarine Campos é presidente do CA de Enfermagem, Karine Campos é presidente do CA de Enfermagem,
    Estudantes de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) acionaram o Ministério Público para tentar dar um basta no sistemático assédio moral praticado por estudantes do curso de Medicina. O Centro Acadêmico (CA) do curso também protocolizou uma denúncia na própria UFMT, no Coren (Conselho Regional de Enfermagem) e na Delegacia da Mulher.

    A presidente do CA de Enfermagem, Karine Campos, afirma que o último ato de desrespeito aconteceu publicamente na segunda-feira (5), às 12h30, em frente ao Restaurante Universitário (RU). Ela conta que os estudantes de Medicina começaram a provocação cantando músicas ofensivas contra as estudantes do curso, sempre colocando a profissional de Enfermagem como objeto sexual.

    “Era o primeiro dia de aula e eles já chegaram no RU sabendo essas letras”, conta Karine. De acordo com a estudante, os calouros são incitados desde o início do curso a desrespeitar os colegas de Enfermagem. Para as estudantes, as letras das músicas ofendem a dignidade das enfermeiras.

    Karine filmou a última ação. “Isso [assédio] sempre acontece, mas é difícil provar. Desta vez tem o vídeo”. As imagens foram anexadas aos documentos enviados para o MP. E esta não é a primeira denúncia feita desta natureza.

    “Eles fizeram uma festa com uma foto de uma enfermeira e nós pedimos para retirar”, lembra. A imagem saiu do panfleto, mas foi postada nas redes sociais com uma tarja de censurado, para provocar, segundo ela.

    Alunas de enfermagem também reclamam da dinâmica entre os estagiários de Medicina e Enfermagem no Hospital Universitário Júlio Muller. Elas alegam que a relação lá também não é salutar. "Eles passam dos limites. Uma vez eles invadiram os corredores cantando essas músicas durante o horário de aulas", relembra.

    Em entrevista por telefone, a reitora Maria Lucia Cavalli Neder afirmou não ter conhecimento de nenhuma denúncia dessa natureza, mas assegurou que, caso chegue ao seu conhecimento, as reclamações serão apuradas. Já as estudantes reclamam que a universidade é leniente com os trotes e assédios que acontecem ao longo do curso.

    “A universidade infelizmente não faz nada, ele repassam a denúncia para o curso de Medicina, que repassa para o Centro Acadêmico, que faz uma nota de retratação”, queixa-se Karine.

    Fonte:http://www.olhardireto.com.br/index.asp

    Imagens mostram dificuldades nos atendimentos do Samu

    Quando a questão é matemática, a solução é fácil. Mas quando é questão de saúde, o problema fica difícil de ser resolvido. São Paulo tem 11 milhões de habitantes. E 120 ambulâncias do Samu, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência.
    Em todo o Brasil, há casos assim. E que ficam mais graves com ambulâncias quebradas, falta de médicos, falta de infraestrutura. Nossos repórteres acompanharam o trabalho dos socorristas e constataram: o serviço criado para salvar vidas não dá conta de atender a demanda.
    Em São Luís, um aposentado morreu depois que o socorro foi negado por quatro vezes.
    Em São Paulo, policiais militares fizeram o parto de uma mulher que não conseguiu uma ambulância.
    Veja os flagrantes impressionantes:
    Saímos rumo à sede da Samu em São Paulo, mas nem precisamos chegar lá. Na Marginal Pinheiros, encontramos uma equipe no meio de um atendimento.
    O acidente deixou dois motoqueiros caídos no chão com ferimentos leves.
    “Ele está equilibrado, está fora de perigo”, disse a enfermeira.
    “São mais contusões, escoriações, mas a gente está aguardando outro resgate para levar, porque são duas vítimas”, informou um médico.
    Vemos um nó. Uma equipe com três socorristas do Samu. Uma vitima já estável dentro da ambulância, já poderia partir para o hospital. Mas falta uma segunda ambulância para a segunda vítima. O Samu não tem unidade de resgate disponível. Foi pedido apoio para o Corpo de Bombeiros.
    Eram 18h, pico do trânsito. E a ambulância vinha de longe.
    Finalmente chega o resgate, 30 minutos depois do registro da ocorrência.
    Com o motoqueiro já imobilizado, a remoção é rápida. Achamos que tudo estava resolvido.
    Mas enquanto acontecia o atendimento do Samu, os curiosos causam outro acidente. Uma freada brusca. É muito comum acontecer um segundo acidente durante o atendimento de uma primeira ocorrência. E aconteceu. Diante da equipe de socorristas.
    Com a ajuda da companhia de tráfego, os paramédicos seguram o trânsito e fazem o primeiro atendimento ali mesmo, no meio da pista. O caso preocupa a equipe.
    “Ela está estável, mas a contusão dele foi mais grave. Ele voou e bateu a cabeça e coluna cervical no chão”, conta o socorrista. Ele diz que a prioridade será dada ao caso mais grave. “Os recursos são sempre menos que adequados a demanda”, diz.
    Vai um, enquanto o outro espera uma terceira ambulância.
    São 120 viaturas do Samu e 40 do Corpo De Bombeiros para todo o município de São Paulo. Com mil e quinhentos quilômetros quadrados e mais de 11 milhões de habitantes.
    Em Salvador, o cenário é pior. A cidade tem menos ambulâncias do que determina o Ministério da Saúde. Pelo menos 22 quebradas. E cinco novas à espera de equipes de socorro.
    “Hoje, infelizmente, tem ocorrência que nós levamos 30, 40 minutos para chegar ao local”, afirma o presidente do sindicato da Samu da Bahia.
    Na periferia de São Luís, a morte de um pedreiro virou caso de polícia. O Ministério Público estadual do Maranhão investiga a denúncia de omissão de socorro. A família diz ter feito quatro ligações para o Samu, sem que nenhuma ambulância fosse mandada.
    Só em São Paulo, a central do Samu recebe nove mil ligações por dia.
    Esta semana, o caso de uma mulher em trabalho de parto não foi tratado como prioridade. O bebê nasceu pelas mãos de dois policiais militares. E o Samu chegou apenas para remover mãe e filho para a maternidade.
    “Quando chegou a solicitação, ela tinha começado a ter as contrações há pouco tempo e não estava ainda de dez em dez minutos. Então, seria o início de um trabalho de parto. Precisa de ambulância, mas não imediatamente”, argumenta Gustavo Guilherme Kuhlmann, coordenador médico do Samu-SP.
    “Eu tenho que estabelecer as prioridades que o sistema me estabelece para poder mandar primeiro os recursos para os casos mais graves”, completa.
    Uma escolha difícil.
    O Samu é coordenado pelo Ministério sa Saúde, mas quem gerencia o trabalho são as secretarias municipais ou estaduais de saúde, dependendo da cidade.
    Em nota, o ministério disse que metade da verba vem do Governo Federal e metade dos governos locais. A nota também informa que o ministério doa ambulâncias e repassa recursos mensais para ajudar no custeio do serviço.
    Hoje o país conta com 2009 ambulâncias e 101 motos em operação pelo Samu. Como vimos, não têm sido suficientes.

    Correção: No texto publicado às 8h02, dissemos que São Paulo tem um milhão e meio de quilômetros quadrados. Na verdade, são mil e quinhentos quilômetros quadrados, como no texto corrigido, às 8h23.
    Veja a reportagem na íntegra no link abaixo:
    http://glo.bo/yqauKH

    quarta-feira, 14 de março de 2012

    A praga das consultas a jato

    Atendimentos médicos que não duram mais do que 15 minutos tornam-se frequentes, o que provoca o erro no diagnóstico e na prescrição de remédios. O que você pode fazer se tiver sido vítima dessa prática

    Monique Oliveira e Luciani Gomes

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    A cena é cotidiana nos consultórios médicos: entre o bom-dia e o até logo dados pelo profissional, passam-se apenas 20, 15 e, às vezes, inacreditáveis três minutos. Quando muito, dá tempo apenas para falar dos sintomas mais aparentes, pegar na mão uma lista de exames a ser feitos ou de remédios a ser tomados. Para que servem e quando mesmo devem ser tomados? Difícil lembrar, já que as explicações foram tão rápidas que nem deu para memorizá-las como se deveria. Também é evidente que o médico não teve tempo para avaliar com a precisão necessária o que foi prescrito. Trata-se de uma realidade cada vez mais frequente, tanto no Brasil quanto em outros lugares do mundo. Inclusive em consultórios particulares, essas consultas, que mais se parecem com um drive-thru de lanchonete, são registradas. E isso contribui para as estatísticas judiciais que mostram aumento nos casos de erros médicos.

    A banalização das consultas a jato é tão grande que levou a uma distorção. Hoje, ser atendido em 15 minutos é considerado um privilégio. Um estudo da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, campus de Ribeirão Preto, em São Paulo, deixou isso claro. Os pesquisadores acompanharam 480 consultas na rede pública e mediram, de cronômetro na mão, o tempo que cada doente passava no consultório. Logo em seguida, perguntaram o nível de satisfação com a consulta. Quem foi atendido entre 11,4 e 15 minutos considerou o atendimento excelente. Os que ficaram de 7,6 a 11,3 minutos acharam a consulta boa. Já os que permaneceram com o médico de 3,8 a 7,5 minutos consideraram-na regular e apenas os que ficaram de 0,1 a 3,7 minutos – ou seja, nem quatro minutos – acharam que foram mal atendidos.
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    Apesar dos efeitos nocivos das consultas-relâmpago, não há no Brasil uma regulamentação que determine o tempo mínimo que uma consulta deve ter. Há apenas um consenso entre os bons médicos de que é impossível fazer uma avaliação correta do paciente em menos de 25 minutos. “Não se coloca o tempo de consulta no contrato porque se supõe que o médico agirá com consciência ética”, afirma Rogério Toledo, diretor do setor de Proteção ao Paciente da Associação Médica Brasileira (AMB). Mas como fazer isso na rede pública, por exemplo, na qual cada médico tem pelo menos 16 pacientes marcados para prestar atendimento em uma jornada de quatro horas? Ou seja, dedicar a cada doente escassos 15 minutos? Esse tempo, aliás, é usado como marcador de produtividade na rede pública, de acordo com o Manual de Auditoria de Atenção Básica do Ministério da Saúde. O documento serve para analisar o atendimento nas Unidades Básicas de Saúde e, segundo uma de suas fórmulas, serviço produtivo é aquele que atende em 15 minutos. Na rede conveniada, o parâmetro é que os profissionais atendam no máximo quatro pacientes por hora – ou seja, os mesmos 15 minutos para cada um.

    O problema é que nem sequer a “regra” dos 15 minutos é respeitada. “Na rede pública há médicos que atendem em dois minutos, no corredor mesmo”, relata o médico Fernando Lucchese, diretor da Santa Casa de Porto Alegre. “Já ouvi colegas dizer que eram pressionados a atender em menos de dez minutos”, completa o proctologista aposentado Albino Sorbino, que durante anos trabalhou no Hospital do Servidor Público de São Paulo. A demanda na instituição pública comprometia o atendimento em seu consultório. “Eram, no mínimo, dois casos graves por dia”, lembra. “Não tinha como fazer essa consulta em 15 minutos e eu ficava sempre três horas além do meu horário.”

    Pouco a pouco, começam a surgir indicativos dos danos causados pelas consultas rápidas. Um estudo feito pela Universidade de Ghent, na Bélgica, revelou um pouco das diferenças que ocorrem quando uma consulta é rápida demais ou acontece no tempo certo. Os cientistas analisaram 2.801 gravações de consultas realizadas em 183 hospitais da União Europeia e categorizaram as relações estabelecidas durante o encontro com o médico. Nos curtos, o tempo é dividido entre perguntas e instruções. Já nos longos, observou-se mais tempo gasto no levantamento de problemas psicológicos que podem estar relacionados aos sintomas e no fornecimento de orientações gerais ao doente. Este último, é claro, é o modelo mais ideal. “A consulta não é o momento de diagnóstico preciso”, explica o gastroenterologista Rogério Toledo, da AMB. “É o momento de se inteirar dos hábitos do paciente.”
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    Uma boa consulta envolve também a coleta do histórico do paciente, exame clínico completo, indicação detalhada de exames complementares, se necessários, e orientações terapêuticas baseadas em pelo menos mais de uma hipótese de diagnóstico. “Tarefa difícil para 15 minutos”, diz o infectologista David Uip, diretor do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo.

    Há outros prejuízos quando esse roteiro não é cumprido. O tempo mínimo compromete a relação com o paciente e pode levar o médico a somente atenuar os sintomas sem tratar a doença. “O profissional vira um grande fazedor de receitas”, diz Lucchese, de Porto Alegre. O atendimento rápido também compromete a interligação de sintomas com situações, já que o paciente apenas responde a perguntas ou é dirigido pelo médico. “E é só deixando o paciente falar que se podem fazer conexões com uma sintomatologia que inicialmente não estaria relacionada à doença”, diz o cardiologista Múcio Oliveira, diretor de emergência do Instituto do Coração, em São Paulo. “O atendimento rápido vai comprometer o diagnóstico”, diz Rogério Toledo.

    Outros riscos são sair da consulta sem entender como tomar o remédio – e tomá-lo errado – ou receber uma prescrição incorreta. No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde, 50% dos remédios comercializados são prescritos, dispensados ou usados de maneira errada. E, segundo especialistas, 49% dos erros são feitos pelo médico, na hora da prescrição. “O profissional faz um diagnóstico apressado, errôneo, e receita o remédio errado”, diz Fernando Lucchese. “O erro nas prescrições é uma consequência inevitável dessa consulta que não privilegia o olho clínico.” Além disso, a pressa eleva a chance de o paciente se submeter a exames desnecessários, sujeitando-se, por exemplo, a receber doses de radiação emitidas por aparelhos de imagem, sem que fosse preciso.

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    EXPRESSO
    Sorbino trabalhou na rede pública de atendimento. Colegas se
    queixavam de ser obrigados a atender em menos de dez minutos
    A falta de coleta de dados e um histórico mal tirado podem levar inclusive à morte. No ano passado, o Tribunal de Justiça de São Paulo indenizou uma família em R$ 30 mil por causa de um atendimento ruim em um hospital privado. Uma criança de 1 mês e 7 dias de vida, com pneumonia grave, voltou para casa apenas com uma prescrição de Novalgina. “Ela morreu de pneumonia porque o médico não coletou os dados suficientes na hora da consulta”, relata o advogado Vinicius de Abreu, representante da ONG Saúde Legal, entidade de defesa de pacientes.

    Uma suposta falta de médicos poderia ser usada para justificar a pressa. Mas isso não é real no Brasil. Em outubro deste ano, os conselhos regionais de medicina registravam a existência de 371.788 médicos em atividade no País, um salto de 530% desde 1970, percentual cinco vezes maior que o crescimento da população. As razões apresentadas por entidades médicas para a disseminação da praga da consulta a jato repousam em outras esferas. Elas argumentam que a baixa remuneração dos profissionais é que provoca a necessidade de atender vários pacientes em um mesmo período. Isso fica mais evidente na rede pública, na qual os baixos salários não atraem muita gente. Como resultado, o número de médicos não seria suficiente para atender à demanda. “Não é novidade que faltam médicos nos serviços de urgência em hospitais públicos”, diz Aloísio Tibiriçá, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina.

    Na rede conveniada, que hoje já atende 9% da população brasileira, menos médicos se credenciam aos planos de saúde também por causa da baixa remuneração. Há planos que pagam menos de R$ 30 por consulta. A consequência: muitos profissionais atendem mais gente do que deveriam para conseguir um rendimento satisfatório. “O médico precisa manter o consultório, mas com os valores pagos só consegue isso aumentando os pacientes por hora ou cobrando no particular”, afirma Márcia Rosa de Araújo, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro.

    Essa realidade vem merecendo reação dos próprios médicos. Recentemente, verificou-se uma onda de paralisações entre os profissionais vinculados a convênios. Em Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, os médicos Marco Leite e João Botelho decidiram fazer o contrário. Para mostrar à população como deve ser um atendimento impecável, reforçaram o time de profissionais em uma das Unidades Básicas de Saúde da cidade em um dia de atendimento. “Tivemos um reforço de oito médicos onde antes havia quatro”, diz João Botelho. E os pacientes finalmente foram atendidos corretamente.
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    É direito do médico pleitear salários mais altos. Mas os governos, os profissionais e as entidades que os representam devem ficar em alerta para não permitir que a baixa remuneração e a ausência de infraestrutura continuem a ser motivos para justificar a proliferação da prática das consultas expressas e suas consequências danosas aos pacientes. As entidades médicas deveriam também – inclusive para proteger os próprios profissionais – exigir das autoridades de saúde melhorias nos sistemas de saúde público e privado.

    No âmbito particular, não há muita explicação para o fato de um médico receber o que quiser por uma consulta e atender seu paciente rapidamente. Uma das argumentações dos profissionais é a de que muitos trabalham em hospitais públicos ou conveniados durante o dia e acabam ficando com pouco tempo para atender à noite no consultório. Mas o paciente não tem culpa disso.

    O que também contribui para a armadilha das fast consultas é uma formação médica baseada mais na técnica do que em um atendimento mais humano. Além disso, muitos médicos são oriundos de faculdades de qualidade ruim, de onde saem às vezes sem saber sequer como realizar um exame clínico correto. Atualmente, o Ministério da Educação supervisiona 17 cursos de medicina que obtiveram conceitos 1 e 2, considerados baixos, no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes. Entre elas estão quatro universidades federais.

    Como não há, porém, uma determinação legal sobre o tempo mínimo de uma consulta, o paciente só poderá processar o médico quando houver um dano evidente e ficarem caracterizadas negligência, imprudência ou imperícia. “Não é porque a consulta foi rápida que o serviço foi mal prestado”, diz a advogada Joana Cruz, do Instituto de Defesa do Consumidor. No entanto, a curta duração da consulta pode ser um indício de que o médico agiu com negligência. “Nesse caso, o consumidor pode usar a curta duração como contextualização”, afirma o advogado Alexei Marqui, especializado em direito do consumidor.

    Para isso é necessário que o paciente produza uma prova de que o tempo di­minuto resultou em negligência. “Ele pode pedir um comprovante da duração da consulta para o médico”, orienta Marqui. Mesmo na ausência de prova, dependendo do caso, o juiz pode determinar a inversão do ônus da prova. Nessas circunstâncias, como o paciente é considerado leigo, a Justiça entende que seria mais fácil o médico produzir uma prova que o defenda do que o paciente oferecer uma prova que acuse o médico.

    Mesmo sem um erro evidente, no entanto, vale registrar a queixa nas operadoras de saúde (para usuários de planos) ou no Ministério Público e secretarias de Saúde (pacientes da rede pública). O doente atendido por médico particular pode resolver na hora. A advogada especializada em saúde Rosana Chiavassa orienta só pagar a consulta depois do atendimento. “Dessa forma, se a pessoa considerar que foi mal atendida ou atendida rapidamente, é só levantar e ir embora sem pagar”, diz. Os indivíduos também têm a opção de recorrer à Justiça quando considerarem que a consulta expressa deixou consequências danosas à saúde.

    A denúncia aos órgãos competentes pode ser uma boa opção para detonar um movimento em massa por consultas mais extensas. Foi a partir da pressão popular, por exemplo, que a Agência Nacional Suplementar de Saúde decidiu diminuir o tempo de espera para a marcação de consultas e exames por usuários de planos de saúde.

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